Via láctea espantada
Estava buscando em algum poeta uma poesia para hoje, para essa dor. Mas não achei... tem dias que não acho.
É que confio na poesia, sempre foi minha íntima religião. Se algo é real está perto desse nada imenso que a poesia defende e revela.
A poesia é essa prova dos 9. Porque alegria nao é, pode ser sádica. Os argumentos também não, que podem ser tendenciosos, mas a poesia é nobre...revela, nos faz mais humanos... Não defende que Deus existe, dá elea de comer a todo que existe...
Ando bem cansada. O cansaço do coração é diferente do cansaço da horta. Cansa a criança em mim, a do Milton, que segura a gente pra não cair. Cansa porque já acordo caindo. Bola de gude... E já caio. Estou dizendo pros amigos. Olha, não sei que aconteceu. E choro. Porque não sei, nem sei se deus sabe.. como assim.. que de uma fenda escondida em um corpo nasceu a maldade em vez de pássaros... era pra nascer um girassol, girassol... um voo, uma floresta, sonhos...
Eu escutava "Naná...", o pão no forno e os versos falavam de todos os voos do corpo, e hoje do corpo de um grande amor nasce veneno, e ainda estou tomada de um espanto.
Tenho convivido com o espanto. Sensação de ser morta a tiros. De repente quem te abraçava como um som feminino de bahia, te tortura agora o coração dizendo "...o amor nosso de cada dia nunca existiu porque tudo que fiz foi não-fiz, foi não-quis, foi não-sou...".
E eu estava lá todo tempo, e a vida era cotidiano mágico, loucuras e luz do sol. Jamais esqueceria o que me fez parir poemas, amiga.
Ter que escrever isso é como visitar um zoológico, ir atrás de uma corsuela que andava pelos montes e dizer "Que fazes ahí? Te metiste aí sozinha, para que, puro animal? Não és um dragão, sos una corsuela de la libertad...
Como dizem nas ruas "No jodas con la memoria". Não dá pra inventar memória. Como dizer que não teve ditadura no Brasil ou 30mil desaparecidos na Argentina, porque alguém depois escreveu livros de história que negam a realidade. No jodas con la Memoria. Isso sim é pecado. Amar..jamais...liberdade, como falta.
O cinismo, diria gioconda belli, é a grande sombra que toca os jovens hoje. O romantismo, as utopias...não morrem de morte natural, morrem na boca dos amores que as declamavam como saltimbancos e de repente as aniquilam para manterem sua imagem social. Covardemente evadem diria "poesia armada de futuro".
há compromisso entre as borboletas e o haiku.
Agora até a via láctea é aprendiz desse semejante espanto!
Nunca me senti assim, a dor é imensa e brega, sem poesia.... Lágrimas na hora errada, no banho, no alecrim tocado, lhe peço ajuda. Planto mais flor que nunca, vou plantando e é quase um suplício, jardim e vez de gazas por favor.
Acordo dolorida e durmo mais dolorida Ainda e a noite sonho contigo . A desilusão corroe, e a cada manhã, minha resistência é ter esperança.. creio no ser humano que virá.
No 1984 de Orwell, queriam mudar a memória das pessoas num sistema perverso de repente tudo que era passado, não era mais, alterado de frente pra trás.
E me sinto sob tua mirada de maquina e respondo com uhuuus e me agarro a visão do rio noturno, as crianças, os cantos, em lembranças e gestos desse amor aberto.
A loucura atordoa, ven até mim hoje, me recuso a aceitar que a felicidade não existiu.
O amor esteve aqui. Sim...A luta sempre foi pela memória e será.
E, querida via lactea... os polos voltam a se namorar sempre. A vida volta a encontrar os paradoxos que enriquece a si mesma... esse momento passará, como pó ao vento do eterno. Retornaremos, pequena. E danceremos de novo todos juntos desafiando os tiranos e a mentira.
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